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Castigo Máximo

De forma colocada, de paradinha, ou até mesmo à Panenka ou Cruijff, marcaremos aqui a actualidade leonina. Analiticamente ou com recurso ao humor, dentro ou fora da caixa, seremos SPORTING sempre.

De forma colocada, de paradinha, ou até mesmo à Panenka ou Cruijff, marcaremos aqui a actualidade leonina. Analiticamente ou com recurso ao humor, dentro ou fora da caixa, seremos SPORTING sempre.

Castigo Máximo

30
Abr22

Tudo ao molho e fé em Deus

Xeque-mate


Pedro Azevedo

Eu ainda sou do tempo em que ir ao Bessa era mais ou menos como tentar atravessar o Cabo das Tormentas. Como consequência, invariavelmente acabávamos naufragados, excepto naquele ano em que o Sousa Cintra apresentou o "novo Eusébio", o Careca, o jogador com os apodos mais enganadores de que tenho memória, por não ser nenhum Pantera Negra nem sofrer de alopécia. Nessa temporada triunfámos por 3-0, exactamente o mesmo resultado com que os brindámos aqui há uns dias atrás. E com toda a naturalidade do mundo, diga-se, que por defeitos que queiram meter no Ruben Amorim - quem não os tem, eu também os aponto -, a grande verdade é que com ele passou a ser natural o Sporting vencer em qualquer relvado do território nacional. É verdade, e por isso é importante que ninguém se esqueça de tomar o Memofante. A não ser que se queira mudar tudo outra vez, correndo-se o risco de se ficar com umas trombas do tamanho de um elefante. Não, tal não seria prudente, diria até que seria suicidário, pelo que longos anos mantenham o Ruben Amorim, o da Boa Esperança, entre nós. Quem provavelmente não teremos no futuro é o Matheus Nunes, o eleito do Guardiola. Eu tenho pena, e lamento o que vejo escrito por aí. É que o Matheus não é um jogador qualquer, e no Bessa até desbloqueou o marcador. Com classe, tal como contra a Turquia. Infelizmente, o Matheus é um mal amado para uma certa estirpe de adeptos. Mas é um craque. E abriu o activo no Bessa, com classe. Sem ponta de lança, caçámos com o que havia mais à mão. Mobilidade e tal, estão a ver... Não houve Paulinho a servir de pivô nem. tão pouco Slimani à procura da profundidade, mas sem ponta de lança goleámos o Boavista. Um xeque-mate no reduto do xadrez, é bom de ver. Com rei (Amorim) e rock, está claro. 

Tenor " Tudo ao molho...": Edwards 

05
Abr22

Tudo ao molho e fé em Deus

A pele de Ugarte contra os Castores


Pedro Azevedo

Jogar de cadeirinha com um assento de Palhinha quando à volta há muitos castores tem tudo para dar mau resultado. A não ser que os roedores decidam "não mexer uma palha", o que anteontem não foi de todo o caso, ou que se mude o tampo (tampão?) para pele de Ugarte, uma espécie uruguaia verdadeiramente predadora de castores. Foi quanto bastou para que o Sporting levasse de vencida a equipa que viajou da Capital do Móvel, porque até aí a exibição leonina esteve muito longe de um cenário das mil e uma noitas, por muito que Paulinho tenha procurado ao máximo emular o persa Taremi enquanto estendia o tapete ao VAR de serviço. No fim, ganhámos como quase sempre. Depois de batermos 3 vezes na madeira. Os postes aparentemente resistiram, ou não fossem de Paços de Ferreira. Já quanto ao Ugarte... ninguém resiste. Nem o mercado, temo. 

Tenor "Tudo ao molho...": Nuno Santos, pela regularidade a alto nível durante todo o tempo, e Ugarte, por ter mudado a face do jogo. 

21
Mar22

Tudo ao molho e fé em Deus

Reviver o passado no Condado Portucalense


Pedro Azevedo

Ir ao Afonso Henriques ver o Sporting é tarefa que requer um kit medieval de protecção pessoal e uma fleuma britânica (por oposição à ira "brutânica" que se vai encontrar) a condizer. Os preparativos para tão grande empreendimento deixam qualquer um exaurido, envolvendo indispensáveis decisões sobre a elasticidade da malha de ferro que se irá utilizar para proteger o corpo, tipo de armadura e escudo de defesa contra pedras e/ou cadeiras, além da complexa escolha entre Prozac, Lexotan, Xanax ou Valium como garantia de imunidade e total impassibilidade perante as circunstâncias. Há ainda que pensar num Plano B que obrigue à tão indesejável acção como último recurso de sobrevivência pessoal, o que conduz ao extenuante esforço de esfregar as meninges à procura de soluções do tipo de como fazer passar uma espada, de 5 kg (semelhante à usada pelo Fundador), de lâmina bem afiada pela segurança das instalações com a mesma facilidade com que se de um petardo de tratasse. Provavelmente devido a todo o desgaste físico e emocional prévio à deslocação, só lá fui por duas vezes na minha vida. A primeira, o meu baptismo de fogo, ocorreu em 80, era eu um menino. Levado pelo meu querido Pai, viajei no Combóio Verde rumo ao título nacional.  A segunda deu-se em 87, na jornada a seguir aos célebres 7-1 com que desasámos as águias em Alvalade. Dessa vez fui de véspera, num combóio regular, com pernoita antecipada no Porto para visitar família e amigos de infância. Recordo-me que nos fizeram a cama, perdão, N'Kama, e tudo. N'Kama (golo de meio campo), mas também N'Dinga, Basaúla, Roldão, Basílio, Miguel e as estrelas Ademir e Paulinho Cascavel, este último que viria a ser nosso mais tarde. E um guarda-redes pequenino e muito elástico que dava pelo nome de Jesus. Com o Marinho Peres no banco e o Autuori como adjunto, e o Veiga Trigo como o circunstancial reforço dessa tarde invernosa que fez vista grossa a um penálti do tamanho do Castelo de Guimarães sobre o Silvinho que nos daria o momentâneo 2-0 (acabámos por perder por 1-3). Nunca tinha pensado maduramente no assunto, mas anteontem dei-me conta de que esta associação das deslocações a Guimarães a combóios era tudo menos inocente. Pelo menos a avaliar pelo facto de que sem o Alfa (Semedo) dificilmente teríamos saído de lá com a vitória. Foi no que deu ser pendular, ainda que para tal tenha tido de usar os braços como equilíbrio para se manter na linha. Mas a surpresa da noite consistiu na constatação de que afinal há um André Almeida que joga à bola e não à canela, o que num cenário bélico não deixou de ser reconfortante. Pelo menos enquanto houve jogo, até porque às tantas o zelo em excesso do Veríssimo levou à expulsão de tantos treinadores e adjuntos do Vitória que eu penso que o massagista assumiu o controlo da equipa. Deve ter sido isso mesmo, porque a partir daí os vimaranenses só conseguiram fazer cócegas e massajar o ego aos nossos jogadores. E num reflexo o Edwards matou o jogo. 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Pedro Gonçalves ("Pote"). Quando Amorim compreendeu que ao ponta de lança faltava apoio frontal, mais do que lateral, o jogo mudou de cara. Excelente exibição também de Adán. E o Paulinho marcou o golo da reviravolta, de Letra (C), ainda que para tal primeiro tenha tido de desperdiçar as oportunidades de letras A e B só com o guarda-redes pela frente.

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15
Mar22

Tudo ao molho e fé em Deus

Slimani contra a seca... de golos


Pedro Azevedo

O erro faz parte do futebol. Quer dizer, à partida o erro deveria fazer parte do futebol. Só que por vezes o erro é mitigado por acção de terceiros. Foi o que aconteceu ontem em Moreira de Cónegos quando um Pinheiro se confundiu com um eucalipto e quase secava tudo à sua volta. A coisa começou quando um defensor moreirense desafiou todos os cânones do bem jogar e, vindo de fora para dentro da sua pequena área, despachou a bola rasteira para a zona central. Por milagre, Edwards, posicionado à entrada da grande área, não captou logo a bola, mas um segundo jogador do Sporting conseguiu-o e avançou com perigo. Subitamente, ouviu-se um silvo. Era o Pinheiro a descascar uma "falta" de Slimani sobre o tal trôpego defensor. Revistas as imagens, o Slimani levou com um pontapé no joelho, consequência reflexiva do alçar de perna do moreirense no momento do chuto. Não sei que regra do International Board o Pinheiro terá rotulado (o joelho e tal...), mas até acho que neste estado de coisas foi uma sorte o argelino não ter levado um cartão amarelo. Sorte que, por exemplo, o Ugarte pouco tempo depois não teve quando numa disputa de bola encostou o seu ombro no ombro de um adversário, o que está bom de ver logo mereceu uma punição disciplinar ao pobre do uruguaio. Punido foi também o Edwards, culpado por reagir a uma falta nítida não assinalada sobre si. E, por falar em nitidez de faltas, o Pinheiro lá viu o Pablo a destruir uma arrancada promissora do Matheus Nunes. O (segundo) amarelo e consequente expulsão é que ficou para um outro dia. Posto isto, o Pinheiro é uma exportação nacional, um internacional com insígnias e tudo. E é também uma comédia, um nonsense que o Flying Circus itinerante de Fontelas Gomes promove pelo mundo. Pena é não ficar por lá, pelo menos a atestar pela sua ausência de uniformidade de critério técnico e pelos 20 cartões amarelos já exibidos a jogadores do Sporting em apenas 4 jogos por si apitados. 

 

O que valeu ao Sporting foi ter um ponta de lança, essa figura que no Sporting já se julgava ser uma lenda da mitologia do mundo da bola. Até que (res)surgiu o Slimani no clube e afinal chegámos à conclusão que um ponta de lança até dá jeito. É o que se conclui quando um jogador recém-chegado contribui com 4 dos últimos 5 golos da equipa. E de todas as maneiras e feitios: 2 de cabeça, 1 com o pé esquerdo, outro com o direito. Não deixando de combinar bem com a equipa, apesar de não ter a técnica mais apurada do avançado centro Paulinho. Dando, porém, outras coisas ao nosso jogo. Como a profundidade ou a capacidade de luta, que o homem mesmo nos seus 33 anos, continua rápido e resistente como um daqueles ases quenianos da dupla-légua. Além disso, a sua actual excelente forma parece ter espicaçado o seu colega Paulinho, ontem autor do outro golo após um belo bailado que envolveu Edwards e Porro. Tudo boas notícias, portanto, razão mais do que o suficiente para eu não querer dar muito relevo àquela segunda parte enfadonha que mais uma vez me fez invocar aquela frase do Bobby Robson em que este afirmava que ao Sporting faltava "killer instinct". (E quando assim é ficamos mais expostos ao "killer instinct" de outros.)

 

Tenor "Tudo ao molho...": Islam Slimani. Completam o pódio o Edwards e o Porro. 

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06
Mar22

Tudo ao molho e fé em Deus

A Vida Natural e a unanimidade de Slimani


Pedro Azevedo

David Attenborough orienta o seu cameraman para captar a acção de um mamífero da família dos Pepus Sanguíneus. Nesse preciso momento, o predador ataca um Casquero em plena savana. Usando as suas patas posteriores, primeiro pontapeia-o, depois, com este já imobilizado no chão, pisa-o barbaramente ao longo da coluna vertebral, finalizando a sua acção com um golpe desferido pelas suas patas anteriores na nuca da presa. É um episódio fulcral da galardoado série "Life in Cold Blood" do consagrado realizador britânico, estrela do canal televisivo BBC. Anos mais tarde, Sir David regressa à savana de Castela, mas o Pepus Sanguínius já migrou para Norte. Incansável, segue o seu trilho até o encontrar. E descobre-o, constatando uma notável evolução da espécie. É que o Pepus é agora um animal domesticado cujas incursões no solo substituíram a imobilização das presas pela captura de bolas de golfe. Um verdadeiro "menino do coro". Nómada, o Pepus por vezes migra até ao sul. E a sua última aparição pública dá-se na pretérita quarta-feira em Alvalade. Simultaneamente nostálgico e entusiasmado, Sir David não resiste e interroga: ficaremos felizes em supor que os nossos netos nunca conseguirão ver um Pepus, excepto no Clube Estela ou em vídeos evocativos do comportamento do Homem de Neandertal? Surpreendentemente, ou talvez não, os avós Sportinguistas respondem que sim...

 

Bom, mas isto foi na quarta-feira. Como a vida não é só história natural, no Sábado o Sporting recebeu o Arouca em mais uma jornada da Primeira Liga, competição outrora também designada por Lampionato e que nos dias de hoje pretende glorificar uma espécie mitológica a que se dá o nome de Dragão (o nosso Campeonato é em si próprio uma figura da mitologia contemporânea). Foi dia de eleições em Alvalade e o mínimo que se pode dizer é que Islam Slimani - os futebolistas quando passam a dirigentes ganham sempre mais um nome - recolheu a unanimidade. Primeiro com cabeça, depois com os membros inferiores (a ausência de partes do corpo humano faz habitualmente a retórica do discurso dos presidentes do clube), Slimani conquistou definitivamente a exigente massa associativa leonina. Mostrando que não só os ponta de lança marcam golos (ah, espera...). Já agora, dizem-me que o Matheus Nunes jogou qualquer coisita, mas ainda não consegui confirmá-lo nas minhas leituras habituais. Será que estão com a cabeça no lugar? Ah, e o Essugo estreou-se a titular aos 16 anos. Uma história natural para os jovens enquanto Amorim estiver ao leme. Das boas, não é Sir David? 

27
Fev22

Tudo ao molho e fé em Deus

Derrapagens


Pedro Azevedo

Caro Leitor, o Sporting começou a derrapar nos Açores. Uma derrapagem numa ilha pequena tem a vantagem de não poder ser muito longa e a desvantagem de a máquina poder facilmente acabar a meter água. Quis o destino que esta última hipótese prevalecesse, pelo menos por aquilo que se pode observar pela leitura da generalidade dos blogues leoninos, sempre transfigurados nestas ocasiões em sofás de psicanálise. E o que nos dizem esses consultórios que medem o pulso à sanidade mental dos pacientes Sportinguistas? Que o Pote este ano não marca os golos suficientes para disfarçar o deserto concretizador do goleador que custou o triplo do dinheiro. E que o Matheus Nunes se deixou endeusar pelas palavras do Pep Guardiola e só quer a bola para ele. Ora, como da nova derrapagem numa ilha desta feita o Pote escapou ileso, as atenções centraram-se no Menino do Rio. O que é curioso porque uma simples leitura das estatísticas da Liga mostra à evidência que o Matheus é o jogador dos 3 grandes que mais faltas sofre durante um jogo. E por larga margem. Faltas essas que lhe limitam a explosão, por serem cometidas precisamente no momento em que sai da zona de pressão (e não quando segura a bola à procura de uma linha de passe) e se prepara para embalar e assim potenciar a sua melhor característica (progressão com bola). Por muito menos o Benfica em tempos lançou a campanha "Deixam jogar o Mantorras", mas nós, que somos finos e gostamos de nos virar contra os nossos (os bons), beneficiamos o infractor, o fautor da falta útil, o culpado que quase sempre escapa à condenação. No fundo isso nem é Sportinguista, é português, está bem presente na cultura lusa de secreta admiração pelo truquezinho e pelos bons malandros, a vingança do povo contra os poderosos e privilegiados à nascença. Só que devem haver limites. É que não só o Matheus não é um saco de boxe como também não é ele que escolhe jogar a partir da esquerda (recebe a bola de frente para o jogo, mas perde aquele momento em que tira adversários do caminho quando recebe de costas na zona central e se vira com maestria). Ainda assim é sempre o primeiro a dar uma linha de passe ao portador de bola, a ligar o jogo. E, sinceramente, até gostaria que fosse mais egoísta, que assumisse mais o jogo, rematasse mais, fizesse prevalecer o seu nóvel estatuto. É que se o Matheus peca por algo não é pelo vedetismo mas sim por ainda alguma timidez que se nota em determinados momentos de um jogo. Assim sendo, podemos enfiar a cabeça na areia como a avestruz ou enfrentar a realidade. E a realidade diz-nos que só arranhámos o Marítimo a partir do momento em que o Edwards entrou. Ora, o inglês esteve cerca de 76 minutos fora das operações. Dividido entre o banco e o aquecimento. O aquecimento global dos Sportinguistas, entenda-se, desesperados que estivemos por uma solução que despertasse da letargia que se viu em campo, unicamente interrompida quando Porro imitou o Theriaga numa carambola às 3 tabelas que envolveu trave, poste e linha de golo. Porque até aí cumprimos brilhantemente com o manual do futebol sem balizas. O Paulinho baixou como sempre (a sua cotação, que não o preço) no terreno e interagiu muito bem com o resto da equipa. E o Nuno Santos fez centros rasos e certeiros para os pés dos jogadores insulares. Neste estado de coisas só o Coates nos poderia ter salvo. Mas a estrelinha parece ter abandonado o uruguaio e uns centímetros a mais para cima e para a direita não deixaram que fosse o habitual salvador. Enfim, do mal o menos, o Slimani fez um golo. Parecendo que não, antigamente tal era visto como positivo, lendo-se o antigamente como uma época da nossa história em que a um ponta de lança eram pedidos golos, como por exemplo em 1952, a última vez que fomos bicampeões. Rezam os livros que gostámos tanto que estendemos o momento até ao tetracampeonato. [Ora bem, esta teve profundidade(!), exactamente o que falta ao nosso futebol. Pensem nisso! (Ou não, que hoje até é dia de descanso...)]

 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Reis

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21
Fev22

Tudo ao molho e fé em Deus

A 18ª regra


Pedro Azevedo

Segundo o International Board, um jogo de futebol tem só dezassete regras. Soa a pouco. Assim sobra muito espaço para as recomendações. Como a da Lei da Vantagem, que o Malheiro tanto desprezou em Alvalade. Não sendo tal ainda suficiente, há então margem para a criatividade. Pululam assim coisas que não são regras mas se praticam em estádios por todo o país. Como a Lei do Mais Forte, que o Luís Godinho mostrou venerar em Moreira de Cónegos ao preferir ver o que não foi nítido e assim poder deixar de vêr o penálti e expulsão (segundo amarelo) a Uribe que se impunham, expulsão essa que mesmo assumindo o penálti já iria aliás perdoar. Essa lei não consta em nenhum manual oficial. Mas acaba por implicitamente se constituir como a 18ª regra do manual de regras do futebol português, o "Pinto da Costa (A)Board" sobre um jogo de futebol. "All aboard? The night train"... (E tudo começou na noite daquele acidental choque do Godinho contra o combóio em movimento que se chamava Danilo.)

 

Na antecâmara do jogo, o Rúben Amorim abraçou efusivamente o Bruno Pinheiro do Estoril. Por momentos, temi que o venerasse tanto quanto ao Guardiola. Mas não, e o Sporting embalou para uma exibição competente e personalizada. Com boas movimentações e trocas de bolas, o Sporting foi-se envolvendo na área onde o Estoril tinha o autocarro estacionado. E o golo finalmente surgiu, com o Pote a aproveitar o facto de o referido autocarro estar mal travado. E depois houve ainda o alegórico Momento Zidane, de passagem de testemunho no casino que também é o futebol, em que o ex-estorilista Matheus Nunes deu à roleta à frente de um croupier Geraldes que muito prometeu dar cartas no passado mas agora precisa que o levantem do chão como no título do livro do Saramago. 

 

O segundo tempo trouxe-nos a expulsão de Raúl Silva e a confirmação de Slimani. Bem sei que esta coisa de um jogador primeiro tocar na bola e depois isso servir de álibi para poder pôr o seu próximo a fazer tijolo no Cemitério dos Prazeres deve ser um caso muito interessante do ponto de vista de um advogado de defesa, mas o bom senso diz-me que, tal como no caso do Bragança, o jogador foi bem expulso. Quanto ao Slimani, para quem dizia que o homem estava velho, corcunda e já nem corria, aquele sprint de costa a costa, com a bola colada ao pé, deve ter emudecido muito boa gente. Além disso, combinou bem com o resto da equipa, participando na elaboração dos segundo e terceiro golos. Só lhe faltou o golo, mas isso ficará certamente para uma próxima oportunidade. Com um homem a mais, o Sporting dominou ainda mais o jogo. E marcou belos golos, o segundo depois de um toque de magia de Paulinho que isolou Matheus Reis, o terceiro num momento de inspiração de Pablo Sarabia.  

 

Temo que este campeonato se vá definir nos detalhes. O detalhe do penálti marcado a Matheus Reis contra o Braga, o detalhe do penálti e expulsão (a Uribe) perdoados ontem em Moreira (e ainda houve uma mão suspeita de Mbemba), já para não falar no detalhe do golo anulado ao Estoril contra o Porto que nem visionamento do detalhista VAR teve (por ter sido imediatamente anulado pelo árbitro). São já muitos detalhes (pouco ou nada nítidos, daqueles que não caberia ao VAR julgar) a depender dos mesmos, pelo que se calhar os mesmos poder-se-iam entregar a actividades que requeressem esse tipo de rigor, como ourivesaria ou mesmo rendas de bilros. Uma coisa é certa, o futebol ficaria mais rico. (E sempre seriam boas alternativas à consultoria informática, que a vida não é só ciberinsegurança ou empresas alegadamente "cibermulas" do dinheiro.)

 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Reis

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13
Fev22

Tudo ao molho e fé em Deus

No Reino dos Visigodos


Pedro Azevedo

Os grandes jogos de futebol lusos são também importantes lições de história, um pretexto para melhor se ficar a conhecer a evolução das comunidades humanas no território que hoje se denomina Portugal. Assim, enquanto a influência romana em Portugal pode ser observada pelo latim que se gasta após os jogos, o legado das invasões bárbaras é continuamente renovado a cada clássico no Dragão. Nesse particular, o líder visigodo, Pinto da Costa (e o engenheiro "visigordo" que é seu lugar-tenente), mostra o quão teme os "mouros", especialmente os que vêm de Lisboa, recorrendo por isso frequentemente a ancestrais tácticas de guerrilha que tanto podem envolver a utilização de reagentes anti-sépticos como de agentes da (des)ordem. Tudo em vão, porque, se a história nos ensina algo, ainda vai acabar a andar à nora... (Já a influência castelhana neste território ficou registada com os olés com que cada Sportinguista em casa mentalmente acompanhou a genial jogada do nosso segundo golo.)

 

Continuando a percorrer a história de Portugal, estes jogos trazem sempre à liça as memórias intemporais dos bárbaros Fernando Couto, Paulinho Santos, Jorge Costa ou Secretário, todos eles anos a fio a gozarem (com a alegada excepção do Secretário) connosco. Era um tempo em que os homens voavam sob a influência dos pitons dos visigodos portistas. Voavam, e por voar acabavam expulsos como o beato Ouattara ou o santo Juskowiak, ambos mártires da Areosa. Mas estava tudo bem, com mais ou menos quinhentinhos, fruta ou chocolate, que de apitos ainda não se conhecia o dourado. A coisa julgava-se já ultrapassada, mas eis senão quando regressou em força na última sexta-feira. Porém, se é verdade que a história frequentemente se repete, não deixa também de ser verídico que sempre adquire cambiantes diferentes. Assim, tanto foi possível observarem-se reminiscências de um outro tempo, do tipo do Matheus Nunes voar após cada nova entrada insuficientemente admoestada pelas costas, como nuances modernaças em que quem voa é o prevaricador - no caso um (A)ladino iraniano que para o efeito deve ter um daqueles tapetes persas das mil e uma noites - e "quem se lixa é o mexilhão" (o importado e importante Coates). Tudo sob o olhar inegavelmente assustado de um Pinheiro, mansinho para os portistas e bravo para os Sportinguistas, provavelmente desejoso de sair dali sem que lhe dessem na pinha. (Ainda assim, a vantagem de ser Pinheiro é que se cria raizes, outros como o Pratas até corriam na hora em que os visigodos levantavam o sobrolho na sua direcção.)

 

No final roubaram-nos: subjectivamente, dois pontos; objectivamente, uma carteira e um telemóvel. Não sei como há quem defenda isto (para além obviamente do Baía, que tem de fazer pela vida e afinal até era guarda-redes), mas há tradições que são difíceis de erradicar. Todavia, que me desculpe o PAN: tourada por tourada, eu prefiro a de Barrancos, que é nossa e não produto da cultura latino-americana. (E quem lidera toma o touro pelos cornos.)

 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Nunes

 

P.S. Ah, e os dois golos que ainda assim conseguimos marcar no Dragão foram tirados a papel químico: variação súbita do centro de jogo (da direita para a esquerda e o seu contrário), bola para o meio e golo. À semelhança de tentos obtidos de igual forma na época passada. Isto também é laboratório.

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07
Fev22

Tudo ao molho e fé em Deus

A metafísica do penálti


Pedro Azevedo

A história dizia-nos não ser fácil para o Sporting jogar contra o Famalição. Disse bem, F-a-m-a-l-i-ç-ã-o, ou Fama Lição, que para os jogadores minhotos cada jogo com um grande é uma montra para a fama, para o mercado (uma equipa de um mercador é naturalmente um amontoado de jogadores com os olhos postos no mercado), momento ideal escolhido para vestirem o melhor fato de gala e exibirem dentro do campo tudo o que aprenderam e não mostraram sempre que o palco foi menor ou despertou menos curiosidade mediática. Sabendo-se de antemão que nunca havíamos vencido o Famalicão para o campeonato (em cinco jogos) desde que este regressou das profundezas das divisões inferiores, os Sportinguistas já estavam precavidos para as lições futebolísticas que mais uma vez poderiam advir desta partida. Ninguém porém poderia esperar que desta vez a lição se fosse centrar sobre a metafísica do penálti e englobasse como protagonistas os numerosos comentadeiros de serviço das diversas televisões, todos eles procurando descrever os fundamentos, as leis, as recomendações, as causas ou princípios e o sentido e finalidade de realidade inerentes à marcação de uma grande penalidade. Surpreendentemente, a coisa acabou por ser um jogo dentro do próprio jogo, estendendo-se até para além do jogo, isto é, o jogo já há muito havia terminado quando a metafísica (ou meta fisica, para alguns) do penálti tomou conta do cenário central de abordagem ao próprio jogo. Deve dizer-se que a discussão teve a sua graça e permitiu-me dar algumas bem audíveis gargalhadas. Uma delas soltei quando um senhor da SportTV garantiu que o Porro havia caído em cima da perna de um jogador famalicense, razão substantiva, na sua opinião, para a marcação de um castigo máximo. Ora, eu não vi nada disso. O que eu vi foi o Porro imitar o Cavaleiro Negro do "Em Busca do Cálice Sagrado" (Monty Python), e já sem braços e pernas tentar, primeiro com a cabeça, depois só com as orelhinhas, incomodar o jogador minhoto como se do Artur de Camelot este se tratasse. E não preciso da metafísica, bastam-me os conhecimentos básicos sobre a física e em particular sobre a dinâmica do movimento, para entender que se alguém me cair sobre uma perna eu fico logo ali, com operação garantida à tíbia e perónio e fisioterapia durante meses, não dou nem mais um passo com o pé firme no chão (se a meia do jogador famalicense fosse branca ainda se poderia alegar no sentido da penalidade o "pé de gesso", mas sendo azul...). Outro momento hilariante foi o do penálti do Paulinho. Quer dizer, um jogador famalicense atrasa mal a bola e ao ver que Paulinho se vai aproveitar desse deslize procura emendar o erro através de um carrinho. A sua perna esquerda é consequente nesse acto e chega primeiro à bola enquanto o Paulinho esboça um movimento teatral ao ir de encontro às pernas do adversário. Até aí nada indiciara a existência de uma falta. Só que a perna direita do defensor desliza na relva e acaba por acertar no calcanhar do avançado do Sporting. Penálti nítido, sem sombra de dúvida, independentemente do La Féria ter no Paulinho um elemento em conta para incluir a trupe do Politeama. Penálti cá, penálti lá, a inquisição espanhola voltou a fazer toda a diferença: Sarabia castigou lá, Adán defendeu o castigo cá. E o Sporting foi para o intervalo na frente do marcador.

 

No segundo tempo os minhotos continuaram a mostrar um bom futebol, nomeadamente através de variações constantes do centro de jogo que muito atrapalharam as marcações do meio-campo leonino. Isso, somado à boa técnica de vários dos seus jogadores, foi criando inúmeros problemas aos leões, que muito devem agradecer o resultado à má definição do último passe/remate por parte dos famalicenses e ao monumental golo (o seu primeiro de verde-e-branco) de Matheus Reis que acalmou um pouco as nossas hostes. Enquanto isso, o Sporting procurava ter bola, única forma de esconder uma menor intensidade resultante do facto de 5 dos 11 jogadores em campo estarem à bica de falhar o jogo com o Porto. A fava acabaria por tocar a Porro, confirmado como o Cavaleiro Negro da noite de Alvalade, que assim estará ausente do Jogo do Título. Uma baixa muito importante para nós num jogo que vai pedir muita garra, disponibilidade física e vontade de vencer a cada um dos nossos jogadores. Bom, mas isso é só para a semana que vem. Para já "matámos" o borrego, seguir-se-á o Dragão. Jogo a jogo. E com Slimani como nóvel cavaleiro candidato a São Jorge (e Edwards como opção a ter em conta). 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Antonio Adán

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(Imagem: A Bola)

23
Jan22

Tudo ao molho e fé em Deus

O Pinheiro do Paulo Sérgio


Pedro Azevedo

Nos jogos do Sporting há regras específicas para a marcação de grandes penalidades. Pegando no adágio popular que diz que um é pouco, dois é bom e três é demais, se um jogador der duas cambalhotas após um ligeiro encosto então os senhores do apito marcarão o castigo máximo. Foi o que aconteceu ontem com Galeno. Todavia, se um futebolista ousar triplicar o número de reboladelas no chão, como aliás o Paulinho amiúde faz, então o árbitro será tentado a deixar seguir. Quer dizer, a vontade de dissimular é igual, em ambos os casos os jogadores teatralizando a morte iminente na esperança de que o padre de serviço avance com a extrema unção, mas o resultado final marcará toda a diferença. Nem que para tal tudo tenha de ser ungido com a benção e alto magistério do VAR de plantão, claro, ou não tivesse já há muitos anos o Paulo Sérgio diagnosticado correctamente o nosso problema: falta-nos um Pinheiro, é o que é, ontem como hoje. Especialmente um daqueles que não seja manso, como tal originário de um certo velho mundo, de casca grossa e raízes profundas e tentaculares. Tudo o resto, não sendo de todo negligenciável, é uma treta. Como a questão dos erros individuais ou a do... ponta de lança. (Pensando bem, ganhar assim seria, isso sim, uma grandíssima treta.)

 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Nunes 

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17
Jan22

Tudo ao molho e fé em Deus

Chapéus há muitos (mas da cartola de Pote saiu a diferença)


Pedro Azevedo

A história do futebol português está repleta de treinadores icónicos. Uns pelo que ganharam, como Mourinho, Artur Jorge e Béla Guttmann, outros pelo seu desassombro, onde por exemplo perfilam Joaquim Meirim, António Medeiros e Quinito. E depois há ainda aqueles cujo carisma pessoal se viu reforçado por um detalhe de indumentária que virou imagem de marca. Desses, o mais célebre é o José Maria Pedroto, um técnico com obra feita no Vitória (de Setúbal), Boavista e Porto. Porém, se o Pedroto passou à história como o Zé do Boné, no distrito de Braga mora actualmente uma sua versão moderna, o Senhor da Boina. Falamos de Álvaro Pacheco, que me faz lembrar um simpático Pai Natal que trocou o domicílio na gélida Lapónia pelo parisiense Quartier Latin antes de pegar nas renas para tomar o gosto por entregar presentes (duas subidas de divisão) ao povo de Vizela. De Meirim, que tinha um espírito flamejante, se conta que um dia, num treino, motivando um dos seus guarda-redes lhe disse ser o melhor da Europa. Intrigado, o "keeper" interrogou-o então sobre a razão pela qual não jogava, mas Meirim logo sentenciou: "porque o Benje é o melhor do mundo". Eram os tempos da Póvoa de Varzim, onde Meirim deixou a marca de uma obra de arte, o seu maior sucesso. Já Medeiros, o Tó de Leça, tinha um jeito peculiar de lidar com as frustrações alheias. De tal forma que um dia, por entre apupos e pedidos de explicação dos adeptos, os mandou falar com o cavalo de Gary Cooper, actor famoso de "westerns" americanos justamente evocado, ou não fosse a realidade do futebol português da época(?) um faroeste. E houve (e felizmente ainda há, embora retirado) Quinito, que se tivesse dinheiro suficiente teria comprado Pedro Barbosa para o pôr a jogar no seu quintal, o homem que compareceu no Jamor de casaca branca e "papillon" (laço) porque de uma gala se tratava essa final da Taça de Portugal em que o Braga defrontou o Sporting de Big Mal (Malcolm Allison), o saudoso inglês que nunca prescindia do seu chapéu Fedora (e do charuto). Álvaro é bem mais comedido no estilo do que estes antigos treinadores, mas partilha com eles uma visão romântica do futebol. Vai daí, tira a(s) barba(s) de molho e põe a sua equipa a jogar à "grande", o que para um "pequeno" é um grande feito. Ontem, mesmo defrontando o campeão Sporting, o Vizela não fugiu à regra e durante os primeiros 10/15 minutos assumiu de peito feito o jogo, contribuindo assim para a qualidade do espectáculo a que se assistiu. E se Adán não tem realizado uma parada brilhante não sei como seria...

 

Em cima falámos de arte. Ora, foi pela arte que o Sporting começou a desbloquear a partida em Vizela. O protagonista (who else?) foi Pote, "Art Deco" em movimento. A mesma elegância do antigo craque do Porto, o toque fino na bola para a levantar ligeiramente antes de a colocar, como se de um passe à baliza se tratasse, de uma forma que guarda-redes vizelense nem com asas lhe chegaria. Lembram-se da final de Gelsenkirchen? Na hora de rematar à baliza, é deste nível Champions que falamos quando invocamos o (con)sagrado - sim, o futebol, com a tribo que arrasta em sua devoção, configura uma religião pagã - nome de Pote. Pouco depois, Nuno Santos fez de pivô atacante e Bragança colocou no ângulo superior com a ajuda de uma pequena deflecção minhota pelo meio. Com a vantagem de dois golos ao intervalo, o Sporting entrou para o segundo tempo a procurar manter a bola na sua posse. Assistiu-se então a uma perspectiva heliocêntrica de futebol onde Bragança é o sol, o Plano B de Amorim, um "tiki taka" luso que personifica Guardiola em contraponto com o habitual "heavy metal" que vai beber ao Gegenpressing de Klopp (quando Matheus Nunes está em campo). Todavia, com o aparente controlo das operações veio a descontração (a "posse estéril"), e com ela a desconcentração. Valeu então Matheus Reis, o lateral que Amorim transformou num centralão de primeira apanha. Ao ponto de ontem ter sido de longe o melhor central leonino. Com Inácio a voltar de uma infecção por Covid e Coates, a contas com limitações do seu joelho, fora da sua melhor condição física, foi Matheus quem pôs ordem na casa na altura de maior aflição. Evitando males maiores. 

 

Mais 3 pontos, aumento da vantagem sobre o terceiro classificado para seis pontos, a jornada não se pode dizer que não tenha sido produtiva. Mas já todos vimos que o Porto este ano está fortíssimo. Como tal, não há como facilitar até ao fim. E a verdade é que este Sporting quebrou um pouco nos últimos jogos, não está tão sólido como noutros momentos desta época. Dir-se-á que e normal, todas as equipas oscilam de forma durante uma época e o Porto também terá a sua quebra, mas é fundamental não perder pontos até ao tão aguardado confronto no Dragão. Que ocorrerá só em Fevereiro, eventualmente até já sem Diaz, esse diabrete à solta que tanto fez a diferença em Alvalade. No nosso caminho segue-se agora o Braga. Já que falámos aqui de chapéus, um "hat-trick" do Paulinho (trabalhou muito ontem) vinha mesmo a calhar no reencontro com a sua antiga equipa. Haveria melhor imagem de marca para ilustrar a sua contratação do que ver o João Paulo de cartola? Haja ilusão. E magia. (O futebol também é feito disso.)

 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Reis

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08
Jan22

Tudo ao molho e fé em Deus

Maldição insular


Pedro Azevedo

Já se sabia que os termos nazareno e catolicismo andavam de mãos dadas, mas ontem tivemos a sua confirmação ao vivo e a cores num jogo de futebol quando o Esgaio incorporou de tal modo o espírito de Santa Clara que acabou a notabilizar-se por uma exibição de uma pobreza franciscana. Paradoxalmente, houve logo quem visse nisso um pecado, imagine-se, mas o Esgaio é um santo homem. Pelo menos, nos Açores. E em Assis, claro. Continuando na senda da dádiva, alguém deveria dizer ao Matheus Nunes que tem de rematar à baliza. São já incontáveis as jogadas que se perdem ingloriamente por optar por um último passe em detrimento do chuto. É uma pena, até porque toda a construção que antecede esse(s) momento(s) tem sido brilhante, mas o excesso de altruísmo do Menino do Rio à entrada da área está a prejudicar o seu desempenho e o da equipa. A ausência no banco de Ruben Amorim foi também uma benesse concedida aos açorianos. O seu adjunto, Carlos Fernandes, ouviu mais pelo auricular do que aquilo que viu com os seus próprios olhos no relvado. O que não viu, e nós também não, foi aquele tocar a reunir que nos caracteriza nos momentos difíceis, deixando que a equipa frequentemente partisse o jogo e deixasse avenidas para circulação pouco comuns em ilhas de pequena dimensão. Com Pote e Paulinho perdulários e a classe de Sarabia a ser sistematicamente mal-aproveitada através de passes em profundidade a solicitar uma velocidade que não tem, o Sporting acabou por deixar 3 pontos nos Açores neste início do ano. A fazer lembrar a eliminação (Taça dê Portugal) aos pés do Marítimo em igual momento do ano transacto, o que configura uma maldição insular de ano novo. Ele há coisas... Como dizem os espanhóis: "yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay". Terá sido por efeito da Madalena Aroso?

30
Dez21

Tudo ao molho e fé em Deus

O WM contra o autocarro


Pedro Azevedo

Caro Leitor, os jogos em Alvalade estão cada vez mais difíceis de vencer! Ontem, por exemplo, deparámo-nos com um daqueles autocarros antigos de passageiros da Eva que já se julgava estarem fora de circulação, com um veio posterior que, qual elástico ou fisga (de David), impulsiona a traseira para a frente nalgumas curvas mais sinuosas. Partindo de uma espécie de um 6-3-1, desse desdobramento portimonense resultou que, subitamente, vários algarvios se abeirassem da nossa baliza, daí nascendo uma interacção entre Adán e Eva que terminou com o pecado original de sofrermos um golo primeiro que o adversário. Na sua génese esteve o Reis, curiosamente um dos melhores em campo. Seguiu-se um jogo de ténis, com a bola a ir e vir constantemente para e da área portimonense sem que o Sporting conseguisse marcar um ponto. Para tal muito contribuiu a robustez do quadrunvirato de centrais algarvio, que impôs a lei perante o marxismo-leoninismo patenteado por uma equipa leonina sub-virada à esquerda, com a ala direita amputada pela inibição de Esgaio e as ligações de jogo interior coartadas pela extrema vigilância dos médios algarvios a Matheus Nunes. O intervalo chegou com o Sporting em desvantagem no marcador.

 

Não demorou muito tempo até que Rúben Amorim mexesse na equipa, Primeiro trocando Palhinha por Bragança, depois abdicando de Esgaio em função do estreante Geny Catamo, um jovem que revelou ter grande personalidade ao procurar constantemente o 1x1, com o suplemento de inteligentemente ter variado as suas acções, alternando os movimentos para fora e para dentro. Com as duas alas finalmente a carburarem em sintonia, os portimonenses viram-se obrigados a bascular sucessivamente a sua linha defensiva como se de uma equipa de andebol se tratasse. Por essa altura já Pedro Sá havia sido expulso por acção de um Reis Mago que assim entregou o ouro a Amorim, pelo que o esforço pedido aos algarvios acabou por provocar uma erosão de onde começaram a surgir falhas. E como tantas vezes acontece no andebol, o espaço para o pivô (atacante) apareceu. Assim, Paulinho acabaria por marcar de cabeça, primeiro, e depois por duas vezes com o pé direito, materializando um hat-trick, um sortilégio digno da magia do Natal que, pasme-se, nem sequer envolveu o seu melhor pé ou o remate de fora da área. Nuno Santos, no segundo tempo muito mais ala que lateral, esteve na origem dos dois primeiros.

 

Para ganhar ao Portimonense, qual "remake" da recepção ao Gil Vicente no ano passado, Rúben Amorim teve de pôr o Sporting a jogar em 3-2-5, o célebre WM popularizado por Herbert Chapman e tão caro aos nossos saudosos 5 Violinos. Curiosamente, Amorim surge agora entre Robert Kelly (79,2%) e Cândido de Oliveira (75,3%), os treinadores dos verdadeiros 5 Violinos que ainda incluíam Peyroteo, no segundo lugar da lista histórica dos treinadores do Sporting com maior percentagem de vitórias (75,31%, 61 em 81 jogos) por jogo realizado, deixando ainda mais atrás nomes como Alexander Peics (4º), Jozsef Szabo (5º), Randolph Gallloway, Mário Lino, Fernando Vaz, Malcolm Allison ou Bobby Robson. E como o nosso treinador diz que o melhor ainda está para vir...

 

Tenor "Tudo ao molho...": Paulinho

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19
Dez21

Tudo ao molho e fé em Deus

Um homem prevenido


Pedro Azevedo

O Nuno Santos é um homem prevenido, como tal vale por dois. Por isso, mesmo com apenas 9 jogadores de campo e um guarda-redes, o Sporting jogou sempre num 3-4-3 e não no 3-4-2 que toda a crítica apontou. Mérito total do ex-jogador da Formação do Benfica, que foi um dois-em-um, defendendo como um Matheus e passando a bola a si próprio como se de um Sarabia se tratasse. Foi assim aliás que nasceu o nosso primeiro golo: o Nuno Reis recuperou a bola na saída para o ataque dos gilistas e lançou o Pablo Santos que logo desferiu um remate que carambolou para dentro da baliza. Na verdade, as expulsões fizeram toda a diferença no jogo: é que enquanto o Ruben Amorim trocou um por dois, o pobre do Ricardo Soares soube de antemão ser impossível substituir uma (Fuji) moto e ficou apeado. Foi galo! 

Quem parece andar às voltas com a sua essência é o Pote. Então não é que o homem decidiu começar a rematar à baliza? Como consequência, os seus golos deixaram de existir. Quando simplesmente passava à baliza o desfecho era inevitável, o golo, mas agora, ao parecer forçar a barra, a bola deixou de entrar. Do mal o menos, se antes marcava como quem assistia, em souplesse, ontem assistiu (Inácio) como quem marca, em força. 

Com o jogo partido entrou o Bragança. Aquilo foi uma delícia, uma coisa a fazer lembrar o Brasil de 82, do Zico e do Sócrates, um festival de toque e retoque que desmaquilhou o resto da compostura barcelista. Como corolário, mais um golo, com classe, obviamente. Bem também o Esteves, o puto faz-se jogador e não tem medo de nada nem de ninguém. 

Do árbitro Tiago Martins será melhor nem falar. Desde confundir o Neto com o avô - sim, o Ugarte joga com tanta personalidade que mais parece um veterano de 20 anos - até não ver um penalty do tamanho do Cidade de Barcelos, passando por ignorar um golpe de MMA perpetrado pelo Fujimoto ou por impedir sucessivos contra-golpes leoninos alegando faltinhas daquelas a que os árbitros por toda a Europa não dão ouvidos (sim, a encenação vem geralmente acompanhada de gritinhos agudos e manhosos), o Tiago Martins fez de tudo um pouco. Em suma, uma arbitragem própria de um jogo de solteiros e casados, do Inatel, com paragens ideais para se tomar uma cervejinha ou fumar um cigarrinho. 

E assim chegou a décima (vitória consecutiva), com o Ruben já a alertar para a urgência da décima primeira. É assim também que se faz este novo Sporting, olhando para a frente e não para o retrovisor. Sem madeixas. Eu gosto. 

Tenor "Tudo ao molho...": Nuno Santos

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04
Dez21

Tudo ao molho e fé em Deus

Dinamatheus


Pedro Azevedo

Com o Rúben Amorim a degustar ao jantar o Mestre da Tactica com 3 batatinhas e o Matheus Nunes a recordar-nos que o Ruca é uma estorinha para embalar meninos, o Sporting venceu sem espinhas na Luz. Durante a semana muito se havia falado das ausências de Palhinha e Coates, como se o Sporting, à laia da B SAD, se fosse apresentar apenas com 9 jogadores em campo. Acontece que o Ugarte e o Neto jogaram mesmo, e o uruguaio destacou-se em particular pela audácia com que encarou o seu novo habitat, não deixando crescer a relva à sua volta. Depois, os movimentos entre-linhas de Pote, a utilização por parte de Sarabia da via verde na auto-estrada existente entre Lázaro (mais tarde, Cebolinha) e André Almeida e a capacidade de pressão alta de Paulinho ajudaram a cavar a diferença. De tal forma que só por sorte o Benfica não chegou ao intervalo a perder por 2 ou 3 golos, algo visível para todos os espectadores excepto para o Mr Magoo que se sentou no banco dos encarnados. Com muitas soluções entre os suplentes para refrescar a equipa, no segundo tempo o Benfica cresceu na partida. Mas então entrou em acção Matheus Nunes: foram duas cavalgadas (eu já tinha dito que ele é um Mustang) de 50 metros que dinamitaram e aniquilaram por completo a resistência encarnada, a primeira concluída com um passe de ruptura(!) a servir de bandeja Paulinho, a segunda directamente a pô-lo na cara do golo e assim permitir-lhe sentenciar o jogo. O que deixa a seguinte questão: quão mais tempo conseguiremos manter o  Matheus afastado da cobiça dos gigantes europeus? É que ele assentaria que nem uma luva no Liverpool de Klopp, por exemplo. Bom, mas isso só acontecerá numa das próximas janelas de transferências, por isso desfrutemos ao máximo dele enquanto podemos. Todavia, será possível ter saudades de alguém ainda presente? Eu já tenho. Ah, e não esquecer o Gonçalo Inácio! Vinte aninhos apenas, mas uma saída de bola a fazer lembrar o Kaiser Beckenbauer e uma coordenação da linha defensiva que deve ter rebentado de orgulho o grande capitão Coates. E assim, com este espírito e esta classe, vai crescendo a onda Sporting. Na crista, a surfá-la com maestria, está o Amorim. Deus o guarde connosco por muitos anos, que não há preço para a felicidade e a alegria nos lábios de crianças e de adultos que há muito já mereciam isto. 


P.S.1. Qual a diferença entre o golo de Sarabia e o tão aclamado golo de Bernardo Silva a meio da semana? 

P.S.2. Sem querer "puxar o saco", já dizia o Cruijff que os sacos de dinheiro não ganham jogos. 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Nunes. Paulinho, Sarabia, Gonçalo Inácio, Ugarte e Pote (anormalmente perdulário na finalização) estiveram também em excelente plano, mas todos os utilizados passaram no teste. 

29
Nov21

Tudo ao molho e fé em Deus

À margem do Lampionato Nacional


Pedro Azevedo

O Sporting fez mais um jogo para o seu campeonato. Por seu campeonato entenda-se um conjunto de jogos que se amontoam num determinado calendário a duas voltas onde todos os adversários se apresentam com 11 jogadores em campo. Bem sei, uma competição assim poderá ser considerada um pouco exótica para a maioria dos cidadãos deste país que torce por outro clube, mas é o que temos. Já o Benfica concorre numa prova à parte, o Lampionato Nacional. Diga-se de passagem que a coisa é bastante desigual, em forte prejuízo dos encarnados. Senão vejamos: se os doutores da bola afirmam convictamente que jogar contra 10 é mais difícil do que jogar contra 11, imaginem o que será jogar contra 9... E, depois, um a um, para aumentar ainda mais o grau de dificuldade, vão-se retirando jogadores de campo da equipa adversária até que fiquem reduzidos a 6 unidades, o que, como se sabe, torna impossível ao Benfica marcar mais golos e mostrar a sua superioridade. Tal é bastante injusto para os actuais pupilos de Jorge Jesus, mas ao mesmo tempo evoca na nossa memória colectiva as origens do futebol: haverá maior pureza do que uma competição que nos remete para as peladinhas da escola, onde havia guarda-redes avançado e tudo? Pois é, o Benfica pode estar 10 anos à frente da concorrência, mas o Lampionato é o seu contributo para o revivalismo do período da Idade da Pedra do futebol. Esbatendo diferenças e promovendo o equilíbrio, nem que para isso tenha de carregar o terrível "handicap" de começar os jogos com homens a mais em campo. Em nome da verdade desportiva, "what else"?

 

Ainda que participando numa competição diferente, o Sporting recebeu ao final de tarde de ontem o Tondela. Estranhamente, a Liga de Clubes não pugnou pelo adiamento do jogo em virtude dos tondelenses se apresentarem completos pelo que a partida realizou-se mesmo, o que com certeza não deixará de merecer parangonas pouco elogiosas nos principais periódicos internacionais. Até parece que já estou a ver um dos títulos: "Doze indomáveis patifes", estrelando os 11 beirões mais o presidente da Liga, com o Proença a fazer o personagem do Lee Marvin, mas com brilhantina e Restaurador Olex quanto baste (o futebol português, os seus "Restauradores" e os Amigos de Olex). Uma vergonha!

 

Esta coisa de ter 11 em campo complica a vida a qualquer equipa. É que há sempre homens a mais em campo, uns dispostos a tocar na bola de forma inadvertida, outros a não saber sair de cena na altura certa. Por isso vimos um tondelense isolar o Sarabia para o nosso primeiro golo e um outro a pôr em jogo o mesmo espanhol aquando do nosso segundo golo, no momento do passe de ruptura do Matheus Nunes (quão mais jogadores, maior a probabilidade de o adversário não estar em fora de jogo). O resto do jogo até foi entretido, com o antigo cérebro (Ayestaran) por detrás do Quique Flores a mostrar que sabe montar uma equipa de futebol. Mas ontem o Neto parecia ter asas e até o Murillo foi apanhar em excesso de velocidade, pelo que a coisa não passou da ameaça. Para piorar a vida aos beirões, o Paulinho marcou um golo - já não bastava aos tondelenses terem de jogar com onze, ainda levaram com um ponta de lança leonino a cumprir com o seu papel. Enfim, um "nonsense" completo... 

 

Na próxima jornada iremos à Luz. À hora que Vos escrevo ainda não sei se o jogo contará para o Campeonato, Lampionato Nacional, ou até se se disputará. É que tanto poderá cair lã dos céus a dar um toque de Natal como a convocatória da omicron alterar os planos a muita gente. Em todo o caso, a Liga deverá dizer qualquer coisa o quanto antes. Ou não, e continuar em isolamento profilático. É que há precauções higiénicas que devem tomar-se para evitar o contágio no futebol. 

 

Tenor "Tudo ao molho...": Luis Neto

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08
Nov21

Tudo ao molho e fé em Deus

Existência vs essência


Pedro Azevedo

Os jogos do Sporting são férteis em confrontos ontológicos entre leões. De um lado temos os adeptos de Sartre, que afirmam a existência preceder a essência do indivíduo. De outro, emergem os defensores de Platão, convencidos do seu contrário. Tudo acaba por resvalar para o campo da metafísica: o que é afinal a realidade? Bom, eu posso conceber que o Paulinho exista sem que a sua essência goleadora esteja definida. Ou, simplesmente, posso determinar que, sendo um ponta de lança, sem uma essência goleadora ele não exista. Aqui estou mais com Sartre, ele existe e ponto, aliás 3 pontos. E assim o Sporting ganha. Quanto à essência do Paulinho... Bom, ela ainda está por definir e pode vir a ser mutante. O não ser goleador no presente não determina em Absolut (NA: a manutenção desta dúvida obriga a uma razoável predisposição etílica disfarçada sob a forma de um pretenso neologismo inteligente) que não venha a sê-lo no futuro, e o reconhecimento dessa competência específica variará consoante a sua produtividade. Recorra-se então à epistemologia e ao método da dialética hegeliana como forma de compreensão do mundo leonino, fragmentando-a em 3 momentos: tese, antítese e síntese. No nosso exemplo, consideremos como tese a contratação de Rúben Amorim. A antítese foi o terror subsequente - técnico sem suficientes provas dadas, muito oneroso para os nossos já debilitados cofres, etc... -  , contudo a síntese disto tudo consistiu em 3 troféus ganhos (campeonato nacional incluído) e numa aposta na Formação que dá garantias em termos de sustentabilidade do projecto desportivo, ou seja, de existência. Porque existindo podemos sempre alterar a nossa essência. Ou descobrir que, afinal, a nossa essência até é relevante para um todo.  Como a do Paulinho...

 

Das essências goleadoras de Coates e Pote é que ninguém duvida. E se o uruguaio desta vez não marcou (mas assistiu para o primeiro golo), o interior facturou como sempre, com um passe à baliza, premissa de um silogismo aristotélico inspirado nas fontes de  Vidago, em que cada vez que o cântaro lá vai é golo (ou gole), logo cada passe à baliza acaba no fundo das redes. Por conseguinte, golos que deviam também contar como assistências, como passes. O que nos leva ao seguinte debate filosófico: o Pote marca como assiste, ou assiste como marca? O que precede o quê? Por falar em preceder, Porto e Sporting precedem o Benfica na classificação geral, cumprido que está um terço do campeonato. Mesmo sabendo que a classificação final são contas de outro rosário (que aliás é composto por três terços), para já a nossa existência (em primeiro) sobrepõe-se à essência (de JJ). Por muito que a goleada ao Braga tenha eventualmente contribuído para uma relação platónica deste com os benfiquistas. Bom, mas agora vêm aí as selecções, um tempo para pôr de lado a filosofia e ir buscar o terço. Acreditando que Deus dita a nossa essência, claro. O Sartre que me desculpe, é a fé. E o Fernando Santos convoca-a. Ai se convoca...(À fé, não ao Pote.)

 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Reis

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31
Out21

Tudo ao molho e fé em Deus

Jogos repetidos com informação incompleta


Pedro Azevedo

Na teoria dos jogos é ensinado que as pessoas que interagem no presente fizeram-no no passado e têm a expectativa de o voltar a fazer no futuro. Para que essa interacção aconteça, a informação é primordial. Informações vitais podem ser reveladas pela acção de um jogador, da mesma forma que um jogador pode inibir-se de praticar determinadas acções a fim de evitar essas revelações. Por exemplo, a colocação de Seba Coates a central é tudo menos inocente. Os jogadores adversários ficam convencidos que ele é um central e tarde demais compreendem que ele é efectivamente o ponta de lança da equipa. Por outro lado, o verdadeiro defensor é o jogador Paulinho, que é apresentado publicamente como um matador. Quer dizer, na verdade ele é literalmente um matador, no sentido em que nos mata do coração a cada novo falhanço, mas a sua função de central mais avançado no campo é muitas vezes ignorada por adversários e até incompreendida pelo público que acompanha os jogos, contribuindo assim para o sucesso da equipa. Outra história de engodo é a que se relaciona com o Matheus Nunes e visa unicamente desvalorizá-lo aos olhos dos adversários. Nesse sentido, a narrativa que foi montada para inglês ver dá-o como tendo sido formado numa padaria da Ericeira, o que contrasta com o prestígio da Academia de Alcochete. É de génio, porque toda a gente sabe que é difícil falar na Ericeira sem se fazerem ondas, ajudando assim a que o embuste pegue mais jogadores desprevenidos. Os adversários olham para o rapaz, ficam condescendentes, julgam até que podem fazer farinha (o que faz sentido com um padeiro) e, quando dão por eles, já estão a correr atrás do prejuízo. Com o Adán é igual. Circulou que ele andou pelos grandes madrilenos a coleccionar autógrafos de galácticos nos treinos, mas isso obedeceu a uma estratégia de longo prazo que visava surpreender tudo e todos quando chegasse a Alvalade. Não fosse isso e o Casillas e o Oblak a única carreira que teriam seria a dos autocarros que os levariam respectivamente a Chamartin ou ao Wanda. Assim, bem podem agradecer ao Adán. 

 

Os exemplos do Coates, Paulinho, Matheus e Adán não surgem aqui por acaso. É que eles esconderam o jogo e forneceram informações incompletas ou erróneas ao nosso adversário de ontem e assim muito ajudaram à nossa vitória. Senão vejamos: uma vez mais, a terceira consecutiva, o Coates voltou a ser decisivo e marcou.   O Paulinho esteve sempre muito preocupado com os contra-ataques adversários, defendendo o que podia e cabeceando para fora um excelente cruzamento do Nuno Santos a fim de não permitir uma eventual parada do guarda-redes do Vitória (ou bola no poste) que desse início a uma transição rápida que pudesse fazer perigar a nossa baliza. (São estes pequenos pormenores que o grande público não entende, e é por isso que o Paulinho é um jogador único e irrepetível e justifica cada cêntimo da sua transferência.) O Matheus arrancou sorrisos amarelos aos vimaranenses a cada nova arrancada, à medida que ia dinamitando as suas linhas com aquele ar de ser apenas mais um dia no escritório. E o Adán mostrou ser como o nadador salva-vidas que a maior parte do tempo está a trabalhar para o bronze mas faz-se ao mar com critério sempre que necessário.  

 

Besiktas, Moreirense, Vitória, os jogos repetem-se. Como dizia o Sérgio Conceição, antes de cada nova contrariedade, é fácil desmontar o Sporting. Pois claro, até La Palisse poderia dizer que é muito mais fácil desmontar um puzzle do que montá-lo (da forma que Amorim o faz). Mas difícil, difícil é parar o Sporting. Dada a informação aqui disponibilizada, talvez a solução passe pelos adversários subirem os seus defesas ao encontro do Coates e recuarem os seus pontas de lança para vencerem o confronto com o Paulinho. A ideia pode parecer estapafúrdia, mas merece ser tentada a partir do momento em que todas as anteriores falharam. Porque com Rúben Amorim a lógica é uma batata. E quem a mete (a batata) lá dentro é o Coates...

 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Nunes

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25
Out21

Tudo ao molho e fé em Deus

A importância de ganhar


Pedro Azevedo

Os jogos com as equipas pequenas e médias são os que tradicionalmente decidem campeonatos. Como tal, é decisivo ganhá-los. E, para ganhá-los, há que marcar golos ou, pelo menos, mais um golo que o adversário, cabendo geralmente ao ponta de lança a dose de leão da contabilidade dessa arte de abanar as redes. É certo que o adepto pode exasperar se aquele que é designado por ponta de lança não fizer jus a esse epíteto, mas no passado já tivemos pontas de lança goleadores como Liedson ou Dost e não deixámos de escorregar e de perder pontos em jogos que antecipadamente dávamos como favas contadas. Por isso, ganhar é sempre o mais importante, marque o Coates, o Paulinho roupeiro ou o Ambrósio do Ferrero Rocher. (Neste último caso, tipo disco pedido do "Quando o telefone toca..." com senha e tudo a condizer, o adepto partilharia o seu desejo com o Ambrosio da seguinte forma: - Ambrósio, apetece-me algo... - Sim, senhor, que tal um golo açucarado? O adepto assentiria, o Ambrósio far-lhe-ia a vontade e ambos, no fim, partilhariam um doce e cúmplice sorriso.)

 

Para além destes jogos tomados como fáceis muitas vezes darem razão à alegoria do David e do Golias, a recepção ao Moreirense em particular sucedia a uma partida desgastante do ponto de vista físico e emocional, de alta intensidade e concentração máxima, disputada na longínqua Istambul. Havia, como tal, razões ponderosas de gestão de plantel a considerar, bem como uma presumível preocupação acrescida da equipa técnica com o foco dos jogadores, algo sempre difícil quando se vem da Cerimónia dos Óscares para a festa de anos do Óscar.  

Assim, há que dizer que a prova foi superada. Não com distinção, até porque do outro lado não estavam exactamente 11 bidões e sim uma equipa que ainda num passado recente veio ganhar com alguma facilidade ao Estádio da Luz, mas de uma forma relativamente tranquila e com poucos sobressaltos, que no fim serviu para garantir os tão desejados 3 pontos. 

O Paulinho não marcou? Não. E teve 5 boas oportunidades para isso. Não sei se será possível estabelecer com o Paulinho uma linha de diálogo do tipo Ferrero Rocher e porventura (o mais certo) ele até poderá ser diabético em matéria de golo e ter um metabolismo que não aguenta níveis elevados de produtividade em frente das balizas, mas enquanto houver uma equipa em vez de 11 jogadores será sempre possível esconder as fragilidades de cada um e sublimar a força do todo. Todo esse onde nós, adeptos, também nos inserimos, levando ao colo o Paulinho aquando da sua saída do terreno de jogo. Para um dia, quem sabe, levar-nos ele ao colo, se bem que "colinho, colinho" é mais fácil presumir do outro lado da Segunda Circular. 

Tenor "Tudo ao molho...": Matheus Reis (melhor exibição de leão). Coates foi, uma vez mais, decisivo (quem é que precisa de um ponta de lança quando tem um Coates escondido lá atrás?). Sarabia já podia ser o rei das assistências deste campeonato, assim concretizassem os seus inúmeros passes com conta, peso e medida para golo. Bragança distinguiu-se pelos bons pormenores com bola, ainda que defensivamente tenha sido leve na abordagem de alguns lances. Ugarte entrou com ganas e mostrou merecer mais minutos e Matheus Nunes ainda teve tempo para uma arrancada típica das suas. 

03
Out21

Tudo ao molho e fé em Deus

De Arouca até Bragança


Pedro Azevedo

Os jogos com o Arouca não se disputam só no relvado e são sempre muito aguardados pelos adeptos. A coisa geralmente envolve animados encontros em túneis e casas de banho, experiências performativas com cigarros electrónicos e dissertações semânticas que pretendem evocar o melhor da literatura  de Bocage. Associados estão também mulrifacetados números de circo, desde as palhaçadas a cargo do Lito das cambalhotas até ao contorcionismo protagonizado por toda a dinastia dos Pinhos. Tudo isto é já um clássico destes embates, e sem isto o jogo em si tende a ser sensaborão independentemente dos golos que se marcarem no campo. Da sua ausência todos nos ressentimos (ou será que não?) ontem, consequência provável da pandemia e do lento desconfinar que ainda recomenda o uso de máscara e algum afastamento social. 

O centralão que governa o país há anos parece também ter contagiado o Ruben Amorim e este começou a aproximar gente dos extremos para posições centrais. Assim, o Coates, nosso Ministro da Defesa. viu-se subitamente assessorado por dois novos secretários de estado. Um deles, o Esgaio, ou não fosse nazareno, ficou com a pasta do mar. Não se pode dizer que não tenha cumprido com as suas obrigações protocolares, nomeadamente quando andou à pesca atrás de um arenque arouquense tão rápido que nem cheirou o isco.  

Por falar em ministérios, o do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social voltou a estar na berlinda. O seu titular, João Paulo ou Paulinho, é sem dúvida trabalhador, mas na hora da verdade puxa mais para a solidariedade e quem se ressente é a segurança dos sócios Sportinguistas. 

De Arouca até Bragança os beirões lá foram pondo o pé em ramo verde, mas a partir de Bragança (inclusivé) as coisas já não lhes correram tão bem. Depois apareceram as invasões francesas lideradas pelo general Sarabia e a capitulação foi quase total. Perto de Bragança, da casa de Matheus, também veio contribuição valiosa, com Nunes e Reis a destacarem-se em simultâneo. E o agitador Nuno Santos não lhes quis ficar atrás e deu a estocada final nas aspirações do desalentado Evangelista de Arouca, que já havia visto o evangelho começar a ser narrado pelo Matheus. 

Tenor "Tudo ao molho...": Sarabia 

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